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Covid-19, os desafios da informação

Por Luis Alceu Paganotto e Junior Ruiz Garcia

A informação é essencial para a tomada de decisão individual ou coletiva. Na pandemia a importância de um bom sistema de informação ficou patente. Essa afirmação foi desde o início da pandemia um alerta, ou muito mais que um alerta, um chamado à conscientização da população sobre a gravidade da presença do novo coronavírus entre nós. Podemos usar aqui qualquer conceito sobre informação, de tantos que se pode encontrar por aí. Mas vamos considerar, neste contexto da luta contra a covid-19, que informação é um conjunto de dados organizados que fazem sentido e referência a um fenômeno com o fim de reduzir incertezas e incrementar conhecimentos sobre ele.

A organização de dados sobre a doença (covid-19) pode ter várias faces. Considerando a necessidade dos gestores públicos que têm a responsabilidade de pensar políticas voltadas ao controle da epidemia, é fundamental organizar uma base de dados que lhes possibilite entender como a epidemia se propaga, a que velocidade o vírus se reproduz, que estruturas são necessárias para enfrentar as consequências e assim por diante.

É sobre a necessidade do gestor público que vamos tratar aqui. São necessárias pelo menos duas coisas para que um sistema de informações tenha eficácia na condução das políticas: um sistema eficiente de registro dos fatos nos locais em que eles acontecem; um sistema capaz de consolidar os dados de todos os locais de registro com rapidez suficiente para assegurar a utilidade da informação.

Assim, imaginado, os eventos relacionados à covid-19 seriam primeiramente consolidados em nível municipal, em seguida os dados municipais seriam consolidados em nível estadual, e finalmente esses dados estaduais em nível nacional. Tudo isso com a velocidade que as modernas tecnologias de processamento de dados nos permitem fazer hoje. Em um país continental, como o Brasil, a estruturação de um sistema de informações por si só já é um enorme desafio, mesmo para as unidades subnacionais. Ao todo, o Brasil tem mais de 5,5 mil municípios, só o Paraná tem 399 municípios. Além disso, muitos municípios não têm capacidade técnica disponível, nem recursos humanos, para dar conta da tarefa.

Desde o início da pandemia no Brasil, a consolidação dos dados da covid-19 tem sido envolta por controvérsias, para além do aspecto político-ideológico. Não existe no país um sistema padronizado e integrado entre todas as unidades nacional e subnacionais, que permita a consolidação no ritmo necessário para a tomada de decisão. No Paraná, um exemplo marcante, tem sido desde o início da pandemia as diferenças observadas entre os dados divulgados pela Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba (SMS) e pela Secretaria Estadual de Saúde do Paraná (SESA). No dia 30 de novembro de 2020, por exemplo, a SESA divulgou 53 novos casos confirmados, por data de divulgação, mas a SMS de Curitiba divulgou 1.254. Diferença de 1.001 casos! Mais grave ainda são as diferenças observadas quanto aos números acumulados: o Município divulgou no dia 2/12/2020 a quantidade de 81.267 casos confirmados da doença até a data e o Estado computa 43.328 casos confirmados para o Município até a mesma data. Essa diferença parece ser consequência de problemas na comunicação entre os sistemas de informações da SMS de Curitiba e da SESA.

Outro desafio tem sido o tempo necessário para o registro nos sistemas de informações municipais e depois para a consolidação no sistema estadual e nacional. Assim, as informações têm sido apresentadas em dois formatos: por data de diagnóstico; por data de divulgação. No início da pandemia, as diferenças no Paraná entre os dados por data de diagnóstico e de divulgação eram relativamente pequenas, mas a partir da segunda semana de novembro observou-se um aumento significativo. No dia 30 de novembro de 2020, por exemplo, a SESA divulgou 2.376 novos casos por data de divulgação, enquanto os novos casos por data de diagnóstico foram 431; mas no dia 02 de dezembro de 2020, para o dia 30 de novembro já estavam registrados 2.887 novos casos por data de diagnóstico, portanto, uma diferença de 2.456 casos.

Uma observação mais atenta sobre os números divulgados pelos Municípios, em suas plataformas específicas, em relação aos divulgados pela SESA e pelo Ministério da Saúde (já que este consolida os dados dos boletins estaduais), mostra várias outras divergências, sem a magnitude das de Curitiba, mas também importantes.

Diante desta situação, quais são as principais consequências disso? Primeiro, a principal característica da informação é sua utilidade. Isso significa que se os dados que o sistema oferece não estão correspondendo à realidade, ou deixam dúvidas sobre a realidade, já que não pode ser considerado um sistema de informações e, por consequência, ao invés de contribuir para a adoção de medidas eficazes pelos gestores, acaba por dificultar a tomada de decisões. Segundo, aos olhos da maioria da população, para quem as medidas restritivas visando conter a pandemia representam um problema, essa confusão acaba funcionando como “muleta” para justificar o descumprimento daquelas medidas.

Essa última consequência é, sem dúvida, a principal. O sistema que serve de alicerce para a adoção de políticas públicas com vistas à contenção do avanço da pandemia precisa ter credibilidade, não basta ser eficiente; para atingir o grau de eficácia desejado, precisa também parecer eficiente.

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