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O trabalho no contexto da Pandemia

(Foto: AGÊNCIA BRASIL)

Em meio a pandemia da covid-19 o 1º. de maio de 2020, em que é celebrado o Dia do Trabalho, se tornou uma data ímpar. A crise sanitária trouxe à tona toda a perversidade do capitalismo neoliberal, através das grandes desigualdades sociais e exclusão de parcelas da população dos circuitos de produção e consumo. Reformas previdenciárias, redução de direitos sociais, desmonte de serviços públicos e as reformas trabalhistas a partir da ideia de flexibilidade nos mercados de trabalho, dão a tônica das políticas adotas antes da pandemia.

Por um lado, fica mais evidente a centralidade do trabalho na vida das pessoas e sua importância para a sociedade, em especial, daqueles trabalhadores em atividades essenciais, como do setor de saúde e alimentação, revelando inclusive a importância de um sistema público de saúde robusto para fazer frente a pandemia. Por outro, percebe-se que muitas formas de trabalho carecem de sentido social ou pessoal, transformando-se em meras formas de obter renda e garantir a sobrevivência. Ao mesmo tempo, vivemos em uma sociedade centrada no consumo de bens e serviços posicionais, o que nos faz refletir sobre as formas de organização social e de consumo.

As desigualdades desnudadas pela crise, mostram uma precariedade do sistema de trabalho, a invisibilidade de atividades de cuidado e a parcela significativa de pessoas sem emprego e sem renda no Brasil. A crise econômica e as medidas de austeridade adotadas pelo governo nos últimos anos, se refletiram em um mercado de trabalho totalmente desestruturado, com milhões de trabalhadores na informalidade, desempregados e desalentados. É neste contexto negativo que o Brasil adentra a crise sanitária, do ponto de vista do emprego e de dinamismo do mercado de trabalho.

As medidas adotadas pelo governo para o enfrentamento da crise vão na contramão do que a maior parte dos países vem adotando, inclusive na América Latina. As medidas legislativas aprovadas emergencialmente produzem uma regulação do trabalho, que visam manter a segurança jurídica e auxílio aos empregadores, do que proteger trabalhadores (as pessoas) ou garantir a segurança no trabalho. Somam-se a isto um enfraquecimento institucional com a extinção do Ministério do Trabalho e o desmonte da Justiça do Trabalho. Assim, as medidas adotadas precarizam ainda mais as condições de trabalho, como a possibilidade de redução de salários e jornadas de trabalho, em troca de uma garantia de emprego por 90 dias, suspensão de contratos de trabalho, antecipação de férias etc.

A redução de renda é brutal, variando entre 25 e 70%, sem qualquer garantia que não existam demissões no segundo semestre. Aliás, a redução de renda não se restringe as fatias mais vulneráveis historicamente, atingindo agora, inclusive profissionais das classes médias, ocupados em setores considerados não essenciais neste momento, como os profissionais da educação e profissionais liberais. Ao mesmo tempo, milhões de brasileiros das camadas mais vulneráveis tentam obter o auxílio emergencial de R$600 prometidos pelo governo federal, insuficiente para manter as condições mínimas de subsistência.

Enquanto isso, o governo já sinaliza com necessidade de redução de gastos com o funcionalismo público e condiciona a ajuda aos estados, a um congelamento de salários e não admissão de novos profissionais por 18 meses. Desde a aprovação da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) dos gastos, o SUS (Sistema Único de Saúde) tem sofrido com a redução de recursos e carência de pessoal há anos. O desmonte dos serviços públicos de saúde fica evidente neste momento, quando não se podem abrir novas vagas no sistema de saúde pela falta de profissionais.

As pessoas pedem socorro. Sejam aquelas que continuam suas atividades em meio a pandemia, sem proteção adequada e expostos à riscos crescentes, sejam todas aquelas que perderam suas formas de sobrevivência, uma vez que ficou claro que o empreendedorismo nada mais é do que uma estratégia de sobrevivência para muitas, que perderam os vínculos formais ao longo dos últimos anos. O cenário futuro indica uma clara e grave crise social, sobretudo, devido às respostas insuficientes e ainda pautadas pela austeridade fiscal dadas pelo atual governo. Sem mudanças significativas nestas medidas, viveremos uma crise social gigantesca no país, com desdobramentos ainda imprevisíveis em termos de movimentos de convulsão social.

Angela Welters – Professora do Departamento de Economia e Coordenadora do NESDE (Núcleo de Estudos em Economia Social e Demografia Econômica) da Universidade Federal do Paraná.

Junior Garcia – Professor do Departamento de Economia e Coordenador do Grupo de Estudos em MacroEconomia Ecológica (GEMAECO) da Universidade Federal do Paraná.

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